sábado, 24 de setembro de 2011

SERMÃO DE JOHN WESLEY - O QUE É O HOMEM? - PARTE 2

O QUE É O HOMEM?
2a. Parte
John Wesley



'Que é o homem mortal para que te lembres dele?
E o filho do homem, para que o visites?' (Salmos 8:4)


1. Mais do que isto, o que sou eu? Com a ajuda de Deus, eu irei considerar a mim mesmo. Aqui está uma máquina curiosa, 'terrivelmente e maravilhosamente feita'. É uma pequena porção de terra; das partículas da qual aderem, e não sei como, estendidas em incontáveis fibras, milhares de vezes mais finas do que os fios de cabelo. Essas cruzam umas às outras, em todas as direções, e são espantosamente forjadas em membranas; que, por sua vez, são forjadas em artérias, veias, nervos, e glândulas; as quais contêm vários fluídos, circulando, constantemente, através de toda máquina.

2. Para a finalidade desta circulação, uma quantidade considerável de ar é necessária. E isto continuamente, através de um mecanismo adequado para este mesmo propósito. Mas como uma partícula de fogo etéreo é ligada a toda partícula de ar (e uma partícula de água também), assim, tanto o ar, quanto água e fogo são recebidos, juntos, nos pulmões, onde o fogo é separado do ar e água, que são continuamente expelidos; enquanto o fogo, extraído de ambos, é recebido em seu interior e misturado com o sangue. Assim, o corpo humano é composto de todos os quatro elementos, devidamente proporcionados, e misturados; o último do qual constitui a chama vital, de onde flui o calor humano.

 3. Deixe-me considerar isto um pouco mais além... Não é a função primária dos pulmões administrar o fogo para o corpo, o qual é continuamente extraído do ar, através daquela curiosa lareira? Por inspiração, toma-se o ar, água e fogo, juntos. Em suas numerosas células (comumente chamadas de vasos aéreos) separa-se o fogo do ar e água. Este, então, mistura-se com o sangue; uma vez que todo vaso aéreo tem um vaso sanguíneo unidos a ele: E, tão logo o fogo é extraído, o ar e água são expelidos pela expiração.

4. Sem esta fonte de vida; este fogo vital, não poderia haver circulação do sangue; conseqüentemente, nenhum movimento de quaisquer dos fluídos, -- dos fluídos nervosos, em específico, (se não for, mais precisamente, como é altamente provável, que seja deste mesmo fogo que estamos falando a respeito). Portanto, não haveria qualquer sensação, nem qualquer movimento muscular. Eu digo que não haveria circulação, porque a causa usualmente afirmada para isto, ou seja, a força do coração, é completamente inadequada para o efeito suposto. Ninguém supõe que a força do coração, em um homem forte, seja equivalente ao peso de três mil libras. Considerando que ele requer a força igual ao peso de cem mil livras, para propelir o sangue do coração, através de todas as artérias. Isto pode apenas ser levado a efeito, através do fogo etéreo contido no próprio sangue, assistido pela força elástica das artérias, em que ele circula.

5. Mas, além desta estranha composição dos quatro elementos, -- terra, água, ar e fogo, -- eu encontro alguma coisa em mim de uma natureza completamente diferente; nada semelhante a algum desses. Eu encontrei alguma coisa em mim que pensa; que nem a terra, água, ar e fogo; nem alguma mistura deles, pode possivelmente fazer: Tendo percebido objetos, através de alguns desses sentidos, ela forma idéias interiores deles. Ela julga, concernente a eles; ela vê, se eles concordam ou discordam uns com os outros. Ela raciocina concernente a eles: ou seja, infere uma proposição de outra. Ela reflete sobre suas próprias operações; ela é investida de imaginação e memória; e alguma de suas operações, julgamento, em específico, pode ser subdividido em outras.

6. Mas, por quais meios eu poderei aprender em que parte de meu corpo este princípio pensante está situado? Alguns homens eminentes afirmaram que ele é 'tudo em tudo, e está em todas as partes'. Mas, eu não consegui saber nada disto: Estas parecem ser palavras que não têm um significado determinado. Vamos, então, apelar, da melhor maneira que pudermos, para nossa própria experiência. Desta eu aprendi que este princípio pensante não está situado em minhas mãos, pés, pernas ou braços. Não está situado no tronco de meu corpo. Qualquer um pode se assegurar disto, através de uma pequena reflexão. Eu não posso conceber que ele esteja situado em meus ossos, ou em alguma parte de minha carne. Assim sendo, tanto quanto eu posso julgar, parece que ele está situado em alguma parte de minha cabeça; mas se na glândula pineal, ou em qualquer outra parte do cérebro, eu não sou capaz de determinar.

7. Mas, mais além: Este princípio interior, onde quer que este situado, ele é capaz, não apenas de pensar, mas igualmente de mar, odiar, sentir alegria, tristeza, desejo, medo, esperança, e ai por diante, e toda uma série de outras emoções interiores, que são comumente chamadas de paixões ou afeições. Elas são denominadas, por um entendimento geral, de vontade: e são misturas e diversificadas em milhares de maneiras; parecendo ser a única fonte de ação naquele princípio interior que eu chamo de alma.

8. Mas o que é minha alma? Esta é uma questão importante e não é fácil de ser respondida.

Ouve tu submisso, mas de um nascimento humilde,
A algumas partículas separadas da mais fina terra?
Um efeito claro de que a natureza tem de procriar,
quando o movimento ordena, e quando os átomos se encontram?

Eu não posso de maneira alguma acreditar nisto. Minha razão recua diante disto. Eu não posso ficar satisfeito com o pensamento de que a alma é tanto terra, água, ou fogo; ou uma composição de todos eles juntos, fosse apenas por esta razão simples: -- Todos esses, quer separados, ou compostos, de alguma maneira possível, são puramente passivos ainda. Nenhum deles tem o menor poder de automovimento; nenhum deles pode mover-se por si mesmo. 'Mas', diz alguém, 'aquela embarcação não se move?'. Sim; mas não por si mesma; ela é movida pela água na qual ela flutua. 'Mas, então, a água se move'. Verdade; mas a água é movida pelo vento, a corrente de ar. 'Mas o ar se move'. Ele é movido pelo fogo etéreo, que está unido a cada partícula dele; e este mesmo fogo é movido, através do Espírito Todo Poderoso, a fonte de todo movimento no universo. Assim sendo, minha alma tem Dele, um princípio de movimento interior, por meio do qual, ela governa com prazer todas as partes do corpo.

9. Ela governa cada movimento do corpo, apenas com esta exceção, e que é um maravilhoso exemplo da sábia e graciosa providência do grande Criador: Existem alguns movimentos do corpo que são absolutamente necessários para a continuidade da vida; tais como dilatação e contração dos pulmões; a sístole e diástole do coração; a pulsação das artérias; e a circulação do sangue. Esses não são governados, por mim, como me aprouver: eles não esperam a direção de minha vontade. E é bom que não façam isto. É altamente apropriado que todos os movimentos vitais possam ser involuntários; seguindo em frente, quer aludamos a eles ou não. Fosse de outra forma, inconveniências graves poderiam se seguir. Um homem poderia colocar um fim em sua própria vida, quando for que lhe agradasse, interrompendo o movimento de seu coração, ou de seus pulmões; ou ele poderia perder sua vida, por mera desatenção, -- por não se lembrar, e não estar atento à circulação do sangue. Mas, com exceção desses movimentos vitais, eu dirijo o movimento de todo meu corpo.  Embora eu não compreenda como eu faça isto, tanto quanto eu não posso compreender como 'TRÊS que testemunham nos céus são UM'.

10. Mas o que eu sou? Indiscutivelmente, eu sou alguma coisa distinta de meu corpo. Parece evidente que meu corpo não está necessariamente incluído nela.  Porque quando meu corpo morre, eu não devo morrer: eu devo existir tão real quanto anteriormente. E eu não posso deixar de acreditar que este automovimento, princípio pensante - com todas as suas paixões e afeições, irá continuar a existir, embora o corpo esteja emoldurado dentro do pó. Na verdade, no momento, este corpo está tão intimamente ligado com a alma, que eu pareço consistir de ambos. Em meu presente estado de existência, eu indubitavelmente consisto de alma e corpo. E assim, eu devo novamente, depois da ressurreição, para toda a eternidade.

11. Eu estou consciente de uma mais propriedade, comumente chamada de liberdade. Ela é muito freqüentemente confundida com a vontade; mas é de uma natureza muito diferente. Nem se trata de uma propriedade da vontade, mas uma propriedade distinta da alma; capaz de ser manifestada com respeito a todas as faculdades da alma, assim como todos os movimentos do corpo. É um poder de autodeterminação, que, embora ele não se estenda a todos os nossos pensamentos e imaginações, ainda assim, se estende às nossas palavras e ações em geral, e não com muitas exceções. Eu estou completamente certo disto, de que eu sou livre, com respeito a esses, para falar ou não falar; para agir ou não agir; fazer isto ou ao contrário, quanto estou de minha própria existência. Eu não tenho apenas o que é denominado de 'liberdade de contradição', -- o poder de fazer ou não fazer, mas o que é denominado de 'poder da contrariedade', -- um poder de agir de uma maneira, ou de maneira contrária. Negar isto seria negar a experiência constante de toda espécie humana. Cada um sente que ele tem um poder inerente de mover esta ou aquela parte de seu corpo; de mover isto ou não; de mover deste modo ou ao contrário, como lhe aprouver.

Eu posso, quando eu escolho (e assim pode cada um que é nascido da mulher) abrir ou fechar meus olhos, falar; ou ficar em silêncio; levantar-me ou me sentar; esticar minha mão, ou recolhê-la; e usar de algum de meus membros, como me agradar, assim como todo meu corpo. E embora eu não tenha poder absoluto sobre minha própria mente, por causa da corrupção de minha natureza; ainda assim, através da graça de Deus me assistindo, eu tenho o poder de escolher e fazer o bem, tanto quanto o mal. Eu sou livre para escolher a quem servir; e se eu escolho a melhor parte, para continuar nela, até mesmo na morte.

Mas diga-me, trêmula criatura, o que é morte?
O sangue apenas que pára; e a respiração interrompida?
O mais extremo limite de um estreito palmo?
E até mesmo do movimento, que com a vida se inicia?

12. A morte é propriamente a separação da alma do corpo. Disto nós estamos certos. Mas nós não estamos certos (pelo menos em muitos casos) do momento em que esta separação é feita. É quando a respiração cessa? De acordo com uma máxima bem conhecida, 'quando não existe respiração, não existe vida'. Mas nós não podemos absolutamente afirmar tal coisa: porque muitos exemplos têm sido trazidos, daqueles cuja respiração esteve totalmente perdida, e, ainda assim, suas vidas foram recuperadas. É quando o coração não mais bate, ou quando a circulação do sangue cessa? Não exatamente. Porque o coração pode bater novamente; e a circulação do sangue, depois de estar completamente interrompida, começar de novo. Então, a alma é separada do corpo, quando todo o corpo está rijo e frio, como um pedaço de gelo? Mas recentemente existem muitos exemplos de pessoas que estavam assim geladas e rijas, e não tinham sintomas de vida remanescente, que, não obstante, com uma aplicação apropriada, recobraram a vida e a saúde. Portanto, nós não podemos mais dizer que a morte é a separação da alma do corpo; mas em muitos casos, apenas Deus pode dizer o momento daquela separação.

13. Mas o que nós estamos preocupados em saber, e profundamente preocupados em considerar é a finalidade da vida. Mas para que finalidade a vida é concedida a meus filhos? Por que fomos enviados para este mundo? Para uma única finalidade, e nenhuma outra: para que nos preparemos para a eternidade. Para isto tão somente, nós vivemos. Para isto, e nenhum outro propósito, nossa vida nos foi dada ou tem continuidade. Agradou ao Todo sábio Deus, na época em que Ele viu que era bom, levantar-se na grandiosidade de sua força, e criar os céus e terra, e todas as coisas que neles existem. Tendo preparado todas as coisas para ele, Ele 'criou o homem à sua própria imagem, segundo sua própria semelhança'. E qual foi a finalidade de sua criação? Apenas uma, e nenhuma outra, -- para que ele soubesse e amasse, e se regozijasse, e servisse ao seu grande Criador para toda eternidade.

14. Mas 'o homem, estando em honra, não continuou', mas tornou-se inferior, até mesmo, às bestas que perecem. Ele decididamente e abertamente rebelou-se contra Deus, e atirou fora sua submissão à Majestade dos céus. Por este meio, ele instantaneamente perdeu tanto o favor de Deus, quanto a imagem de Deus em que ele foi criado. Quando ele foi, então, incapaz de obter felicidade através da antiga aliança, Deus estabeleceu uma nova aliança com o homem; os termos da qual não foi 'faça isto e viva', mas, 'creia e você será salvo'. Mas, ainda assim, a finalidade do homem é uma só e a mesma; apenas ela se situa em um outro fundamento. Porque o teor claro dela é: 'Creia no Senhor Jesus Cristo, aquele a quem Deus enviou para ser a reparação para seus pecados, e você será salvo'; primeiro, da culpa do pecado, tendo a redenção, através do seu sangue; então, do poder do pecado, que não mais domina sobre você; e então, da raiz do pecado, para a imagem total de Deus. E sendo restaurado, ambos para o favor e imagem de Deus, você deverá conhecer, amar e servir a Ele para toda a eternidade. De modo que a finalidade de sua vida; a vida de todo aquele nascido no mundo é conhecer, amar, e servir ao seu grande Criador.

15. Observe que, como assim é a finalidade, então esta é toda e a única finalidade para a qual todo homem sobre a face da terra, ou cada um de nós, foi trazido para o mundo, e dotado de uma alma vivente. Lembre-se! Nós não nascemos para coisa alguma mais. Nós não vivemos para coisa alguma mais. Sua vida e a minha continuam na terra, para nenhum outro propósito que este, para que possamos conhecer, amar e servir a Deus na terra, e nos regozijarmos nele para toda a eternidade. Considere! Nós não fomos criados para satisfazermos os nossos sentidos, para gratificarmos a nossa imaginação, para ganharmos dinheiro, ou louvarmos a homens; para buscarmos felicidade em algum bem criado, em alguma coisa debaixo do sol. Tudo isto é 'caminhar em sombra vã'; é conduzir uma vida impaciente e miserável, com o objetivo de uma eternidade miserável. Ao contrário, fomos criados para isto, para nenhum outro propósito; para buscarmos e encontramos felicidade em Deus na terra; para afirmarmos a glória de Deus no céu. Portanto, que nossos corações digam continuamente: 'Está é a única coisa a ser feita', -- ter uma coisa em mente, nos lembramos do porquê nós nascemos, e do porquê continuamos a viver, -- 'para atingirmos a marca'. Eu objetivo uma única finalidade para minha existência, Deus; 'Deus em Cristo reconciliando o mundo para si mesmo'. Ele deverá ser meu Deus para sempre e sempre, e meu guia, até mesmo na morte!

Bradford, 02 de Maio de 1788.

John Wesley tinha 85 anos; três anos antes de falecer

[Editado por George Lyons para a Wesley Center for Applied Theology.]


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