O Contexto de
Corinto
A igreja de Corinto era uma igreja que havia sido
muito abençoada por Deus em diversos aspectos. Quando Paulo inicia esta carta
ele reconhece, no capítulo primeiro, que Deus havia abençoado a igreja com toda
sorte de bênçãos espirituais, de dons espirituais, ao ponto de “não lhes faltar
dom nenhum”. Corinto era uma igreja carismática no sentido bíblico da palavra,
ou seja, tinha os “carismas” do Espírito de Deus, os dons, através dos quais
desenvolvia seu serviço prestando culto a Deus e cumprindo a sua missão neste
mundo. Infelizmente, por motivos que desconhecemos, esta igreja de Corinto, que
havia sido fundada pelo apóstolo Paulo, com menos de três anos de fundada
começou a desviar-se dos padrões de conduta e de doutrina que o apóstolo havia
estabelecido por ocasião de sua fundação.
Paulo estava no seu último ano de ministério na
cidade de Éfeso, quando recebe informações de que a igreja de Corinto não
estava indo muito bem. As informações eram muitas e poucas delas eram boas.
Paulo soube que havia divisões na igreja, que estava dividida em 4 grupos.
Grupos que se formaram em torno de personalidades, de pessoas que tinham tido
uma participação no passado recente da igreja, com o próprio Paulo e Apolo
(cap. 3:4). Havia até um grupo que talvez fosse o mais perigoso deles que era o
“grupo de Cristo” (‘...e eu, de Cristo” Cap 1:12). Eles diziam que não
eram seguidores de homem algum e sim de Cristo. Era como se dissessem: não
queremos estar debaixo da orientação ou da instrução e autoridade de qualquer
homem porque recebemos tudo diretamente de Cristo. Alguns estudiosos têm
identificado este grupo como o “grupinho dos espirituais” que falavam em
línguas e se gloriavam por terem experiências extraordinárias; que não
aceitavam a autoridade de Paulo na igreja e outras coisas mais.
A igreja tinha todas estas divisões e além disso
tinha problemas de ordem doutrinária. Um grupo não aceitava a ressurreição dos
mortos (cap. 15). Havia um espírito faccioso naquela igreja; existiam problemas
com respeito à doutrina da liberdade cristã ( 10:28). “Será que posso comer
carne sacrificada aos ídolos”? Os “fortes” diziam que sim e subestimavam os
“fracos”. Havia problemas com respeito às questões do casamento (cap. 7): O que
é mais espiritual? Casar ou ficar solteiro?
A igreja estava dividida por uma série de problemas
que se refletiam no culto. Os “espirituais” falavam línguas sem interpretação
para a igreja e desta forma não edificavam (14:5); os profetas falavam, mas não
havia ordem de quem deveria falar primeiro (14:29, 32); as mulheres
entusiasmadas estavam querendo tirar qualquer sinal de que há uma diferença
entre homem e mulher dentro da ordem da criação de Deus (11:8-9); na hora da
Santa Ceia havia pessoas que até se embriagavam (11:21) e participavam do
sacramento sem ter o espírito apropriado. Corinto era uma igreja com graves
complicações. Mas, mesmo considerando isso, era uma igreja que se gloriava de
ser “espiritual”. Afinal, muitos, na concepção deles, não tinham os dons que
indicavam a presença do Espírito Santo? Muitos não estavam falando em línguas
durante o culto (Cap. 14)? Outros não estavam profetizando e trazendo palavra
de revelação? A igreja pensava que era espiritual e considerava-se assim apesar
de estar toda minada de problemas.
Entre os problemas mencionados havia também
problemas morais. Havia um irmão que estava processando outro num tribunal
secular (6.4). Talvez a igreja não tenha se interessado o suficiente. A verdade
é que não chegaram a um acordo e talvez por questão de terra ou talvez de dinheiro e negócios, este irmão estava em
litígio com outro. Por isso estava processando-o no tribunal da cidade. Com
esta atitude estava expondo o Evangelho à vergonha diante dos ímpios (v. 6).
Havia um grupo que estava voltando à prática da
prostituição religiosa (6:18-19), o que era comum na cidade de Corinto. Isso
era praticado nos templos onde se cultuava a deusa Afrodite.
Refletindo esta separação entre espiritualidade e a
conduta moral surge um problema relatado no capítulo 5 e que estava bem de
acordo com a natureza e espírito da igreja. Havia um homem, membro da igreja,
que estava vivendo com sua madrasta. Seu pai provavelmente ainda estava vivo,
mesmo assim estava tendo “um caso” a mulher de seu pai. O mais grave é que isto
era do conhecimento não só da igreja mas também da própria sociedade de
Corinto. Era algo notório e se comentava; circulava rumores verdadeiros com
respeito a este incidente. Nos traz constrangimento o fato de que a igreja de
Corinto, como um todo, parecia não ver nada de grave nisso: “Afinal Deus não
está em nosso meio? Vejam o que acontece nos nossos cultos”! E este homem continuava
a viver com sua madrasta às vistas de toda a igreja! Mas o que mais incomodava
o apóstolo Paulo era a falta de uma atitude firme por parte da igreja com
relação àquela pessoa. Ou seja, a igreja deveria constatar que conduta moral e
espiritualidade são duas coisas que andam juntas. Temos de ter as duas coisas;
e quando temos uma e não a outra, ou a espiritualidade é falsa ou a moralidade
é falsa. Mas a genuína espiritualidade exige uma conduta de acordo com as
verdades do evangelho.
O interessante é que Paulo não se dirige à
liderança da igreja. Paulo, ao escrever, não se refere aos líderes mas fala à
igreja como um todo. Porque, mesmo que no sistema presbiteriano, estes casos
tenham a ver inicialmente com o Conselho, o fato é que na base do problema,
além de um caso notório, pecado é um problema de toda igreja. É uma questão que
afeta todos os membros e que não é somente responsabilidade do Conselho olhar
para a vida dos outros membros e tomar algum tipo de decisão, mas que é
responsabilidade de cada membro do corpo de Cristo zelar para que haja pureza,
santidade, que haja no convívio da comunidade, verdadeira santidade ao Senhor.
É uma responsabilidade de nós todos e não somente do pastor e dos presbíteros.
É importante, portanto, que Paulo trata da questão dirigindo-se a toda
comunidade. Talvez alguns estranhem este fato. Nas denominações batistas e
congregacionais as questões disciplinares são resolvidas pela assembléia.
Apesar de acharmos benefícios no sistema de governo representativo, através de
pastores e presbíteros, a interpretação desta passagem só pode ser neste
sentido: Paulo não está se referindo aos pastores e presbíteros porque ele sabe
que a responsabilidade de vivermos uma vida santa na igreja, é de cada um dos
seus membros. Devemos não só zelar por nós mesmos mas também pelo nosso irmão
refletindo as palavras de Jesus: “Se o teu irmão pecar, vai repreendê-lo entre
ti e ele só, se ele não te ouvir, leva mais alguém, se não te ouvir, comunica a
liderança da igreja para que tomem as providências”. Mas, antes de chegar a
este ponto existe todo um processo intra comunitário desenvolvido pelos
membros, cada um participando e sendo responsável para que a vida da igreja
ande corretamente. Se não for assim corremos o risco de sermos participantes
dos pecados alheios e incorrermos na culpa de cumplicidade.
Assim, o apóstolo Paulo, no capítulo 5, chama a
igreja à ordem e nos fala de forma apaixonada, fala com amor pela igreja; nos
fala da responsabilidade que todos temos de cuidar de nós mesmos, de vivermos
vidas santas e, de como comunidade, zelarmos para que o nome de Cristo seja
honrado e glorificado através da vida santa da comunidade dos santos.
Infelizmente nem sempre atentamos para esta maneira de Paulo abordar o problema
em vista do nosso individualismo. Mais freqüentemente do que desejaríamos
ouvimos falar de piedade em termos individuais, ou seja, piedosa é a pessoa que
se fecha no seu quarto para ler e orar gastando tempo a sós com Deus. E
santidade seria algo que se desenvolveria individualmente. Quando falamos em
santificação geralmente temos a figura de uma pessoa em mente e nos esquecemos
que Novo Testamento geralmente estas coisas são contempladas à luz da
comunidade. Piedade é algo que eu exerço junto com o povo de Deus; culto
não é algo que eu presto individualmente a Deus, somente, mas algo que faço com
meus irmãos. Santidade é algo comunitário. Nós crentes caminhamos a vida de
santidade juntos. Perdemos de vista este aspecto corporativo da Igreja
apresentado no NT. É tão importante, salutar, equilibrado e abençoador para
cada um de nós a idéia de andarmos juntos, vivermos juntos e nos santificarmos
com a ajuda uns dos outros. É neste contexto que o apóstolo trás estas
palavras.
O Texto
No versículo 1 e 2 encontramos o apóstolo Paulo
apresentando o assunto que vai falar. Ele coloca o problema com palavra muito
claras. O problema é duplo:
Primeiro,
Paulo inicia dizendo que “Geralmente
se ouve que há entre vós imoralidade...” (v. 1) e depois especifica que
imoralidade é esta. O pecado é de incesto que está proibido pela Lei mosaica em
Deuteronômio 2:30 e outras passagens do VT onde Deus revela Sua repulsa ao
adultério e muito menos que um homem faça isso com a mulher do seu pai. Era um
caso claro de transgressão da Lei de Deus. É importante notarmos que para o
apóstolo Paulo, a Lei de Deus sempre estava em vigor para o cristão. Paulo
caracteriza bem esta imoralidade, e, muito embora não faça uma referência clara
ao Antigo Testamento, há evidências na passagem, de toda legislação do VT sobre
a conduta moral e sexual do povo de Deus. É bom enfatizar isso numa época em
que as pessoas têm demonstrado descaso para com a Lei de Deus e para com os
padrões morais das Escrituras. O apóstolo está muito à vontade expressando o
ensino do VT para uma comunidade de cristãos do NT e caracterizando a conduta
daquele indivíduo como sendo imoralidade à luz dos padrões Vetero
Testamentários. Isso nos trás a um ensino importante, o de ter em alto apreço o
Antigo Testamento que também é revelação de Deus para nós cristãos, ainda hoje.
Tudo que foi escrito, para nosso ensino foi escrito, para que através das
Escrituras e da paciência tenhamos conforto e esperança.
Esta era a primeira parte do problema: uma relação
incestuosa de um homem que vivia com sua madrasta e que era do conhecimento de
todos, como se vê nas palavras de Paulo: “Geralmente se ouve que há entre
vós imoralidade...” (v. 1).
A segunda parte do problema está no v.2: “E,
contudo, andais vós ensoberbecidos, e não chegaste a lamentar, para que fosse
tirado do vosso meio quem tamanho ultraje praticou?”. O que angustiava o
apóstolo Paulo não era só o pecado em si, mas que a igreja, ao invés de
“lamentar” o fato de ter um de seus membros vivendo uma relação pecaminosa e
tomar a providência correta, que na ocasião seria tirar do meio da comunidade
aquele indivíduo que não havia se arrependido (a julgar pelo que Paulo diz), ou
que não queria corrigir-se. A atitude da igreja deveria ser excluir este membro
contumaz. Paulo está angustiado pelo fato da igreja não tomar esta atitude para
zelar pela vida e pela pureza da igreja, pelo nome de Cristo e pelo
próprio pecador. Ao contrário, a igreja estava ensoberbecida, envaidecida
possivelmente por causa dos dons espirituais. Os membros estavam orgulhosos de
constituirem uma igreja “carismática”, ou quem sabe, uma igreja que amava a
todos do modo que eram e de como agiam. Uma coisa é certa: Paulo entendia que a
atitude da igreja não estava correta. Ao invés de lamentar e chorar pelo fato
de um membro está sofrendo, e quando isso acontece, todos sofrem com ele, Paulo
pensa na igreja em termos corporativos e vê uma comunidade negligente por não
lamentar-se em vista do pecado que estava no seu meio. Ela assume uma postura
oposta “festiva”, com um culto alegre, enquanto ninguém estava se preocupando
com o problema. Paulo estava angustiado por ver um membro vivendo em pecado e
por constatar uma igreja tolerante que convivia com o problema sem nenhuma dificuldade.
Antes mesmo de dizer os princípios pelos quais a
igreja deveria expulsar o malfeitor que “tamanho ultraje praticou”, Paulo já
vem com a solução para o problema, até contrariando seu método habitual, usado
na primeira carta aos Coríntios. Paulo geralmente coloca o problema, introduz
uma série de princípios doutrinários e no final apresenta a conclusão. Mas
Paulo parece tão atribulado que apresenta o problema e logo dá a solução; só
posteriormente fala sobre as doutrinas que estão por trás da questão. Isso,
talvez pela angústia que lhe passava na alma em vista do grande amor que tinha
por aquela igreja. Do versículo 3 até o 5 Paulo diz o que vai fazer. Ele fala
como apóstolo de Jesus: “...já sentenciei...”. Ele usa das prerrogativas
de apóstolo, a quem foi dada autoridade para edificar a igreja, fazê-la andar e
para trabalhar no seu fundamento. Como tal, ele sentencia. Esta palavra “sentenciar”
vem da linguagem jurídica que significa o pronunciamento final de um processo
de julgamento. A igreja deveria ter feito isso e por que não fez, Paulo toma
para si as prerrogativas de juiz. Ele mesmo faz o julgamento, sentencia o
membro infrator dizendo: “...que o autor de tal infâmia seja, em nome do
Senhor Jesus, reunidos vós e o meu espírito, com o poder de Jesus, nosso
Senhor, entregue a Satanás para a destruição da carne, a fim de que o espírito
seja salvo no dia do Senhor [Jesus]” (vs. 3-5).
Quando o apóstolo Paulo sentencia que aquele
infrator seja entregue a Satanás, ele o faz nos termos do ensino de Jesus.
Paulo aqui está ecoando o ensino de Cristo quando disse num contexto de
disciplina: “Porque onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali
estou no meio deles” (Mt 18:20). Jesus já havia dito dois versículos atrás
(v. 18) que: “...tudo o que ligardes na terra, terá sido ligado no céu, e
tudo o que desligardes na terra, terá sido desligado no céu”. Este é um
contexto de disciplina, quando Jesus estava respondendo a Pedro sobre o que
deveria ser feito se um irmão pecasse contra ele. Jesus diz que a igreja
reunida em espírito, com a presença do Senhor e em Seu nome deveria exercer o
“poder das chaves”; de admitir alguém no Reino de Deus ou então excluir através
da disciplina. Paulo está ecoando o ensino de Jesus quando diz: [Eu, juntamente
com vocês] “em nome do Senhor Jesus, reunidos vós e o meu espírito, com o
poder de Jesus, nosso Senhor...” (v. 4). Dessa forma Paulo sentencia o
membro daquela igreja.
O que significa “entregar a Satanás”? Isto
tem sido bastante debatido e não vai fazer muita diferença na interpretação
geral da passagem. Em linhas gerais se acredita que Paulo estava dizendo o
seguinte: Uma vez que a pessoa não queira ouvir a voz da igreja, não aceita a
repreensão do Espírito Santo, e, sendo excluído da comunidade, será como
uma ovelha que foi colocada para fora do aprisco. Lá fora estão os lobos à
espera. Satanás vai cirandar, vai colocar sua mão em cima. O objetivo de Paulo
com isso não é destruir a pessoa como muitos pensam em relação ao ato
disciplinar. Em termos eclesiásticos alguns pensam de disciplina como algo que
trás simplesmente punição ou destruição do pecador. Mas não é este o objetivo
da disciplina. Apesar de todo rigor e firmeza de Paulo em tratar o assunto, ele
diz: “...a fim de que o espírito seja salvo” (v. 5). Este é o objetivo
que Paulo revela na sua carta; o amor por aquele pecador e seu desejo de
recuperá-lo, mesmo que para isso medidas drásticas tenham de ser tomadas. Paulo
não fica vacilante. Se tem de ser entregue a Satanás, que seja, para que o
espírito seja salvo. Se for o único meio, que assim seja excluído da igreja,
ficando fora da proteção do Senhor e ficando exposto aos ataques do diabo.
Ataques que são descritos no livro de Jó, quando este servo de Deus
experimentou na carne a atividade satânica como doenças, aflições, perdas dos
bens, etc. Em fim, toda sorte de aflições que com o decreto de Deus
Satanás às vezes pode infligir às pessoas para que o propósito de Deus seja
feito. No caso, para este membro da igreja, o propósito era trazê-lo de volta
ao seio da igreja através das aflições, angústias, dificuldades, e tribulações
que Deus permitiria (decreto permissivo) que Satanás trouxesse a este membro em
pecado. Ele deveria ser levado ao arrependimento, cair em si e voltar ao
convívio da igreja.
Não sabemos se a “estratégia” funcionou. Na Segunda
carta que Paulo escreve à Igreja de Corinto há uma menção de alguém que se
arrependeu, que mudou sua atitude. Paulo não diz quem foi esta pessoa. Mas
Paulo recomenda que a igreja o receba, que o aceite, que não prolongue
demasiadamente a disciplina para que ele não desfaleça. Alguns entendem que
seja exatamente este homem citado por Paulo no v. 5.1. Se for o caso, a
disciplina teria funcionado e o pecador voltado arrependido, recuperado,
restaurado, e a igreja o teria recebido com alegria. Paulo passa para uma
postura final e só depois explica o porque desta atitude. Pode parecer aos
ouvidos pós-modernos uma atitude muito radical. Mas Paulo explica o porque de
sua atitude.
As Razões de
Paulo Para a Disciplina Rígida
1) Porque o pecado é como o fermento (v. 6).
Se não cuidarmos ele se alastra e contamina toda a massa: “Não sabeis que um
pouco de fermento leveda a massa toda?”. Paulo usa uma linguagem muito
comum no VT. No VT uma das coisas usadas para tipificar o pecado é o fermento.
Tanto é que na celebração da páscoa era proibido se comer pão com fermento (o
pão era “asmo” – sem fermento). O fermento era símbolo do pecado. Uma das
propriedades do fermento pelas quais ele tornou-se símbolo do pecado, é sua capacidade
de aumentar e dominar o ambiente onde se encontra. Se colocado um pouco de
fermento no pão que está sendo preparado logo levedará toda a massa. O apóstolo
diz que o pecado é exatamente assim. Paulo pergunta se os crentes de Corinto
não sabem disso: Que o pecado é como o fermento, que leveda toda a massa? A
idéia é que, se deixado sem correção, no seio da igreja, sem que as devidas
soluções sejam tomadas, o pecado se propaga. O que pensar dos jovens da igreja
de Corinto? O que eles estavam aprendendo quando viam aquele homem vivendo com
a madrasta e ninguém dava importância? O que eles estavam aprendendo?
Aprendiam, que aquela atitude não faz diferença na vida cristã e que não
importa nosso comportamento sexual. Podemos continuar em pecado e como um cristão
normal. Era essa a mensagem que estava sendo passada para os membros da igreja;
que o pecado realmente não importava porque a igreja parecia aceitar
normalmente. Qual a mensagem que está sendo passada para os jovens e novos
convertidos? Que o pecado não afeta meu estado, o meu relacionamento e minha
comunhão com Deus e nem a vida da igreja. Ou seja, o que é pregado no púlpito é
totalmente desfeito por este tipo de atitude. Nós podemos pregar santidade, e
se temos de viver vidas santas mas não acrescentarmos à Palavra pregada as
medidas corretas para que todos nós trilhemos este viver santo, a mensagem
deixa de ter seu efeito.
Quando Calvino começou sua obra em Genebra ele
tinha a idéia de que se houvesse apenas pregação fiel da Palavra de Deus e administração
correta dos sacramentos, a igreja seria edificada, os crentes ouviriam e os
problemas se resolveriam. Algum tempo depois, Calvino reconheceu que era
necessário e bíblico acrescentar um terceiro elemento: a disciplina
eclesiástica.
Há necessidade do exercício da disciplina
eclesiástica feita em amor para recuperação do pecador e para que se coloque em
prática o que a Palavra de Deus nos recomenda e exige. O mais importante é que
Paulo não está aqui falando para a liderança. Ele está falando para toda a
igreja. Não caiamos no erro de interpretar mal o apóstolo Paulo pois o
que ele fala é para todos nós; é responsabilidade de toda a igreja zelar pela
vida da comunidade seguindo os princípios bíblicos. Porque o pecado é como o
fermento. Se deixarmos ele contamina a massa toda. Que mensagem estamos
passando para o mundo? Qual a mensagem que a “Tiazinha”, que se diz evangélica,
passa para o mundo? Sua mensagem é que não importa seu comportamento sexual,
sua profissão corrupta. Assim, se conclui que cabe tudo na igreja.
Estamos vivendo um momento de crise de referência
na igreja brasileira. Ou seja, precisamos de pessoas que sejam referenciais. A
pouco tempo a revista “Isto É” publicou um suplemento sobre os maiores
religiosos do século e citava Dom Evaristo Arnes, Alziro Zarur, Chico Xavier,
Madre Tereza, Leonardo Boff, Frei Beto, Marcelo Rossi, mas nenhum evangélico.
Pode ser apenas preconceito contra os evangélicos, mas pensemos qual evangélico
poderia estar nesta lista? Soubemos depois que o candidato dos evangélicos
seria o Bispo Macedo. Se há um momento em que a igreja precisa fazer diferença
no Brasil, é hoje. E temos de começar nos lembrando de que o pecado é como o
fermento. Ele destrói a reputação da igreja, a sua credibilidade, seu ensino, e
por isso temos de tratá-lo com firmeza. Devemos começar conosco mesmo, sendo
implacáveis com nós mesmos e brandos com os outros, mas firmes no geral. Tudo
isso para evitar que o pecado se alastre. Este é o caminho. Não estou me
referindo a fazermos cruzadas de moralidade; não creio nisso. Mas devemos
pregar o ensino simples do evangelho e como lemos nos salmos “que os que temem
ao Senhor odeiem o pecado”, se afastem do pecado pois este é o ensino de toda a
Bíblia. O primeiro ensino é este: O pecado é como o fermento e se nós não
cuidarmos ele tomará conta de tudo corrompendo as consciências.
2) O segundo argumento de Paulo está baseado na
Páscoa (também vem do Velho Testamento). Aqui no v. 7 Paulo se refere a Cristo
como sendo nossa Páscoa e que ele já foi imolado por nós. Paulo compara a vida
da igreja a uma grande Páscoa, a uma eterna festa. O nosso Cordeiro Pascal já
foi imolado e nós já nos alimentamos dele e se vivemos em uma eterna Páscoa,
não deve haver fermento. Tem de ser lançado fora os fermentos, a massa velha.
Por isso Paulo diz: “Lançai fora o velho fermento, para que sejais nova
massa...” (v.7). A Igreja é a comunidade Pascal liderada, salva e resgatada
por aquele que é a nossa Páscoa. Na festa da Páscoa não podia se ter pão com
fermento. Essa é a figura que Paulo usa. Se há pão fermentado já não é mais
Páscoa. No v. 8 Paulo diz da vida cristã que “celebremos a festa, não com o
velho fermento, nem com o fermento da maldade e da malícia; e, sim, com os
asmos da sinceridade e da verdade”. É só quando a sinceridade e a verdade
prevalecem que nós verdadeiramente celebramos. Somos uma comunidade que
celebra, que vive na alegria, no gozo da santidade do nosso Cordeiro.
É claro que Paulo não está pregando o
perfeccionismo. Mas alguns podem ter esta idéia; Paulo não está pedindo que a
igreja seja perfeita, mas sim que a igreja de Corinto tome as atitudes certas
quando o pecado aparecer. O pecado vai aparecer, é verdade, e pode ser em minha
vida e na sua, mas que a comunidade ajude o pecador com interesse de
auxiliá-lo. Não devemos ficar falando mal e criticando mas que tomemos as
providências bíblicas para ajudar aquele que caiu vítima do pecado. Celebremos
a festa com os “asmos” da sinceridade e da verdade.
3) Vemos um outro princípio nos versos 9-12. Há um
momento para uma separação santa. Infelizmente há momentos em que somente uma
separação resolve. A separação da comunidade colocada aqui por Paulo é daquele
membro impenitente que não deseja arrepender-se. Parece que Paulo coloca este
ponto em destaque (ele gasta vários versículos nisso) provavelmente porque ele
sente que foi mal compreendido. Paulo já havia escrito uma primeira carta aos
coríntios. Essa primeira carta que conhecemos é, na verdade, uma segunda carta,
porque Paulo já havia escrito uma carta antes que foi perdida. Paulo faz menção
desta primeira carta perdida no v. 9. Nesta primeiríssima carta ele já havia
falado da necessidade de separação, de não haver associação entre o cristão e a
impureza. “Já em carta vos escrevi que não vos associásseis com os impuros”.
Aparentemente os coríntios haviam entendido que
Paulo estava falando que os cristãos não deveriam ter qualquer contato com incrédulos.
Por isso os coríntios concluíram que não haveria problema de ter associação com
aquele irmão, mesmo que em gravíssimo pecado, visto que era “irmão”. Eles
haviam pensado da primeira carta de Paulo que não deveriam se associar apenas
com quem não fosse cristão. Paulo, então, corrige este equívoco e diz: “Já
em carta vos escrevi que não vos associásseis com os impuros; refiro-me com
isto não propriamente aos impuros deste mundo, ou aos avarentos, ou roubadores,
ou idólatras; pois, neste caso teríeis de sair do mundo”. Paulo, aqui, está
dizendo que não estava dizendo que não se associassem, ou mantivessem contato
com este tipo de gente, com os pecadores deste mundo, porque, se assim fosse,
teriam de sair do mundo. Paulo nunca sugeriu um gueto ou mosteiro, nem ao menos
estava sugerindo que não convivessem com os não cristãos. O que Paulo diz é: “Mas
agora vos escrevo que não vos associeis com alguém que, dizendo-se irmão,
for impuro, ou avarento, ou idólatra ou maldizente, ou beberrão, ou roubador;
com este tal nem ainda comais” (v.10). O que Paulo está dizendo é que não
devemos nos associar com aquele que “dizendo-se irmão”, se fazendo
passar por cristão, no meio da comunidade se comportem como não cristãos. A
estes nem devemos convidar para uma refeição em nossas casas. Em outras
palavras, há um momento em que é necessária uma separação clara e firme.
Muitos podem estar pensando nas palavras de Jesus
quando disse: “Não julgueis, para que não sejais julgados” (Mt 7:1). É
claro que Paulo e Jesus não estão em contradição. Quando Jesus disse estas
palavras ele o fez no contexto do julgamento indevido. Ou seja, alguém julgar o
comportamento de uma pessoa e não julgar-se a si mesmo. Lembremo-nos que nesta
mesma passagem Jesus diz: “Por que vês tu o argueiro no olho de teu irmão,
porém não reparas na trave que está no teu próprio” (Mt 7.3). O que Jesus
proibiu foi o julgamento desproporcional, sendo pesado para com os outros e não
para consigo mesmo. Isto não é correto! Mas quando Jesus fala estas palavras
condenando o julgamento precipitado, no versículo 6 Ele diz: “Não deis aos
cães o que é santo, nem lanceis ante os porcos as vossas pérolas...” (Mt
7:6). Para eu cumprir este mandamento eu tenho de saber quem é “cão” e quem
é “porco”. Ou seja, tenho de exercer julgamento. É claro que Jesus não
está proibindo que nós, pelas evidências, pelo comportamento, por aquilo que
está evidente e claro, cheguemos a uma conclusão de que uma pessoa não está se
comportando como um cristão deve se comportar. Assim sendo podemos tomar as
devidas providências.
Paulo termina este terceiro princípio dizendo: “Pois
com que direito haveria eu de julgar os de fora?” (5:12a). Paulo está
dizendo que não vai julgar os de fora que não são cristãos e que vivem em outro
contexto. E então pergunta: “Não julgais vós os de dentro?” (v.12b).
Paulo aqui deixa muito claro que julgar os “de dentro” é competência da
igreja. Não vamos julgar os de fora, pois Deus os julgará. É isso que Paulo diz
no versículo 13: “Os de fora, porém, Deus os julgará” (v.13a). Mas os de
dentro sim; a comunidade julga os de dentro e toma as providências para recuperar
o faltoso, o extraviado, para trazer de volta o que se desviou. E, se
necessário for, para isso, a santa separação, que haja separação.
Paulo conclui no v.13 dizendo: “Expulsai, pois,
de entre vós o malfeitor”.
Conclusão
Estamos vivendo uma época em que se Paulo viesse
expor esta mensagem, desta forma, não seria bem recebido.
Hoje se diz que a verdade é relativa e que cada
pessoa tem sua própria verdade. Estamos vivendo a relativização dos valores
morais. Se diz que a vida de cada um é governada por aquilo que a pessoa sente
que é melhor. Se a pessoa está se sentindo bem em determinado lugar, se algo
está fazendo-lhe bem, então, não importa outras questões, outros critérios. O
critério que é usado é sentir-se bem e passa a ser o principal para governar a
conduta das pessoas. O que valida uma situação ou uma conduta é eu estar ou não
me sentindo bem no que estou fazendo.
Esses conceitos têm predominado em nossa sociedade
e em muitas igrejas. A relativização na mídia, nas músicas, nos escritos modernos,
nas universidades, nos debates da ética e da moralidade. Os formadores de
opinião pública nacional estão totalmente envolvidos na pós modernidade que
resume tudo que foi dito. Tudo isso acaba minando a vida da igreja, a
literatura, os seminários, os congressos. Às vezes, de forma sutil, nos
tornamos avessos aquilo que venha nos contrariar, que venha nos obrigar a
dizer: “Isso está errado!”.
Mas temos de fazer a escolha. É um momento sério de
decisão da Igreja, se vamos viver à luz da Palavra de Deus e de seus valores
absolutos ou se vamos nos deixar levar pelos “ventos” da época.
A Palavra de Deus nos chama a viver vidas santas e
retas. Nos chama a aborrecer o pecado e se necessário, tomar as devidas
providências para que ele não tenha livre curso em nosso meio, nas nossas
vidas, nas nossas famílias. Tomar a providência necessária em amor, em espírito
de brandura, olhando por nós mesmos para que não sejamos também levados pelo
pecado mas ajudando-nos mutuamente, levando as cargas uns dos outros para que a
comunidade toda viva vida de santidade e de alegria. O problema não é o pecado
somente, mas o pecado não resolvido. Para o pecado há perdão, resgate, redenção
e libertação. O problema não é só o pecado mas o pecado não confessado, não
reconhecido e não tratado. É contra isso que Paulo fala. Que Deus nos ajude.
Lembremo-nos que esta mensagem é para a igreja e
não para os líderes. Sempre fico admirado com Paulo pelo fato de que quando
fala de disciplina eclesiástica ele não se dirige aos pastores e aos
presbíteros apenas mas fala para à comunidade toda. É nossa responsabilidade de
orarmos e vivermos vidas santas ajudando-nos uns aos outros a nos livrar do
inimigo das nossas almas. Esse é o pior inimigo: o pecado não tratado.
Que Deus nos dê graça e misericórdia para vivermos
segundo o padrão da Palavra de Deus.
MINISTÉRIO PALAVRA VIVA
ANO XIX
Nenhum comentário:
Postar um comentário